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A montagem da dramaturga e diretora Ada Luana, apresentada na 33ª edição da mostra de teatro, costura o clássico de Tchecov com textos contemporâneos.

Transcrição
00:00Música
00:00Quem ousa ir navegar numa balsa?
00:16Numa embarcação tão pobre?
00:20Sair pro mar, sob o risco de ser aniquilada,
00:24sem barreiras, trincheiras ou plano B.
00:30É uma loucura, né?
00:32O que encanta no Tchekov, o que encanta na Gaivota,
00:35eu acho que é esse tema da elevação,
00:38esse tema de nunca desistir daquilo que é realmente essencial pra você.
00:43E essa lição que eu acho que na vida todos nós vamos aprender em algum momento.
00:51A gente precisa, como diz a Nina, carregar a cruz e suportar,
00:56e aprender a ter fé e seguir.
00:58Fora extra-teatro, ele como contista, tem aquele poder de pegar a vida cotidiana,
01:08os heróis cotidianos, e trazer pra cena e fazer a gente ter reflexões profundas.
01:16Você não precisa estar num castelo em Elcino ou alguma coisa pra poder falar de temas profundos da existência humana, né?
01:23Vocês só sabem sufocar e criticar.
01:26Eu tenho muito mais talento que vocês dois juntos.
01:29Arrogante!
01:29Por que você não vai embora, hein?
01:32Vai e se enterra naquele seu teatrio medíocre!
01:34Cala sua boca!
01:35Eu nunca, nunca fiz nada de medíocre, tá?
01:38Como atriz, eu já gostava tanto das peças dele,
01:41porque eu queria atuar, fazer todas as personagens dele, que eram incríveis,
01:46justamente porque são mulheres que estão atrás de realização pessoal,
01:51de uma realização profissional, que não focam a sua vida só na maternidade,
01:56no casamento, em serem subservientes.
02:00Então, apesar de não ter ali um discurso feminista, obviamente,
02:03mas se a gente quiser travar um diálogo, é possível,
02:09porque as mulheres, que geralmente são as personagens centrais das obras...
02:13Ideia para uma peça nova.
02:15Uma mulher navega a bordo de um navio.
02:18E ela é feliz e livre como uma gaivota.
02:23Mas aí aparece o iceberg.
02:25Eu tive dois movimentos nessa dramaturgia.
02:28Um foi pegar a narrativa dele e ver como eu conseguia abrir um diálogo
02:34questionando os lugares daquelas mulheres,
02:38porque ainda que essas mulheres sejam fortes, determinadas,
02:41elas vivem dentro da peça em situações de opressão de gênero.
02:45Então, eu fui travando diálogos através das personagens femininas.
02:50O outro movimento foi justamente escrever textos autorais
02:54que perpassam a obra.
02:57Então, eu faço a abertura dos atos.
03:00Então, eu estou com essa espécie de voz.
03:04Não é uma personagem, sou eu mesma, como narradora, como autora, ali, falando.
03:09E eu estou introduzindo constantemente durante esses quatro atos
03:14a ideia do que é escrever como mulher.
03:17E uma ideia central que vem da Helene Sissou,
03:21nesse livro O Riso da Medusa,
03:23que discute o que é escrever como mulher.
03:26É como escrever como mulher.
03:28E ela tem, na tese dela, porque é um manifesto desse livro,
03:32ela diz que a gente só pode escrever roubando.
03:35Porque a gente só pode escrever, nós, mulheres,
03:38a partir da tradição masculina.
03:40A gente não tem uma tradição de escrita,
03:42porque as mulheres sempre foram interditadas de escrever, né?
03:45Historicamente.
03:46Então, eu acho que é usar o Tchekhov, roubar do Tchekhov,
03:51roubar o protagonismo ali daqueles personagens para trazer as mulheres
03:54e, ao mesmo tempo, instigar outras mulheres a criarem,
04:02a fazerem o mesmo, ou correrem atrás dos seus sonhos e por aí vai.
04:06Não tem dó no peito, não tem jeito,
04:09não tem ninguém que mereça,
04:12não tem coração que esqueça,
04:14não tem pé, não tem cabeça,
04:17não dá pé, não é direito,
04:19não foi nada, eu não fiz nada disso
04:22e você fez um bicho de sete cabeças.
04:26Transcrição e Legendas por Quintena Coelho

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