• há 7 anos
As gémeas Cristelle e Danielle nasceram em 1996, de uma mãe adolescente, que pagava a uma ama para ficar com elas enquanto ia trabalhar.
Um dia, “Sofia” (nome fictício da mãe biológica) não conseguiu juntar dinheiro e não apareceu durante duas ou três semanas. Quando lá voltou, já tinham entregado as filhas no lar da IURD.
As gémeas chegaram ao lar a 29 de outubro de 1997 e é aqui que a sua vida se cruza com a de Nídia Martins, a advogada do lar.
A mãe biológica garante que, quando descobriu o lar, ainda lá foi várias vezes, mas não lhe deixaram ver as filhas.
Uma ex-funcionária do lar, gravada com uma câmara oculta da TVI, diz que as gémeas “entraram e saíram logo, com a Nídia”. Nem chegaram a dormir no lar, garante.

Mas Maria Odete, a avó paterna, veio de Angola em 1999 para tentar recuperar as netas.
“Prescindi de muita coisa em Angola, da minha vida, para poder cá estar por causa das minhas netas. Aluguei uma casa como mandaram alugar, fiz o quarto delas… Ganhei a questão em tribunal, vou para ir buscá-las e o casal não aparece com as meninas pura e simplesmente!”
O casal de que fala a avó e os documentos de tribunal é Nídia, a advogada do lar e o seu marido médico. Mas o tribunal não parece perceber que Nídia Martins é advogada em causa própria no processo, e marca e adia várias visitas para evitar o encontro da avó com as netas, as gémeas que queria adotar.
No entanto, em maio de 2000, o Tribunal da Relação de Lisboa manda entregar as gémeas à avó. Nídia desobedece e recorre para o Supremo Tribunal de Justiça, que não aceita o recurso.
A avó foi agora surpreendida por uma decisão do tribunal de Vila Nova de Gaia, de 2012, em que Nídia Martins consegue adotar Danielle e Cristelle, que hoje se chamam Maria Daniela e Maria Catarina.
Nídia Martins já tinha adotado Francisco, um recém-nascido no Hospital S. Francisco Xavier. Enquanto advogada do lar, está envolvida nas adoçoes ilegais denunciadas pela TVI.
A TVI descobriu-a a viver no interior do Algarve e esteve duas vezes com a advogada, que recusou qualquer explicação quando confrontada com os documentos por si assinados.
“Tudo o que fiz, se aquilo que a senhora diz é verdade, fiz na ignorância…”
A TVI também encontrou uma mãe, Ester Simão, cujas filhas, também gémeas, foram entregues no lar da IURD por uma vizinha, crente da igreja, enquanto a mãe estava doente.
Neste caso, a luta da mãe, mesmo perante as ameaças do lar, foi suficiente para travar o processo de adoção e as filhas voltaram à família.
Mas afinal quantas crianças foram adotadas entre 1994 e 2001 neste lar ilegal da IURD? A TVI questionou a Segurança Social e a Santa Casa da Misericórdia, mas nenhuma das instituições respondeu a esta pergunta.
A luta de Anabela
Houve mães que lutaram até à morte, como Anabela Silva, cujos filhos lhe foram retirados de uma barraca na zona de Camarate e entregues no lar da IURD.
“Enganaram o meu pai e a minha mãe para nos tirarem… Assinaram uns papéis e quando eles nos quiseram recuperar já não dava”, conta Íris Freitas, filha de Anabela.
A mãe era toxicodependente, não faltava às visitas e acabou por refazer a sua vida na esperança de recuperar os filhos.
“O que acontecia muitas vezes é que ela chegava lá e não estavam lá as crianças. Ela falava-me sempre no tal livro de assinaturas… Às vezes o livro não estava lá, outras vezes o livro não era o mesmo, portanto havia vários livros”, diz “Fernando”, antigo namorado de Anabela.
Anabela foi surpreendida pela adoção de dois dos seus filhos num dia que os vai visitar. Ficou doente, mas não se rendeu. Conseguiu um advogado oficioso, que pouco ou nada fez para a defender, mas teve acesso ao processo e contrapos o relatório falso que encontrou.
Anabela nunca chegou a obter resposta ao requerimento que fez e, enquanto isso, a filha tentava sobreviver ao pesadelo de uma adopção falhada e foi vítima de maus-tratos.
Mas há mais notícias de adoções falhadas. "Rita", outra criança do lar, conta à TVI como viveu três anos com a família de um bispo da IURD e foi devolvida quando este regressou ao Brasil.
“O meu processo foi bom enquanto lá estive, mas depois devolveram-me… Quando se devolve uma criança, não têm noção do trauma... É como se fosse uma peça de roupa que não se usa mais.”
No próximo episódio, vamos contar a história de um pai que só agora soube que a sua filha, afinal, não tinha morrido. Foi roubada por um bispo da IURD...

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