• há 7 anos
Cantam os jornais de hoje os costumeiros ditirambos lavrados para a necrologia de marcar-o-ponto a respeito de um tal Cabral, de seu nome Luís, que por Portugal viveu mais de um quarto de século sem que alguém se atrevesse levá-lo à barra dos tribunais. O homem foi um inimigo de Portugal - o que é isso, caramba, coisa de somenos, quando os mais implacáveis adversários da ideia portuguesa se consideram, eles também, portugueses ? - e mandou matar, por atacado, sem dó e sem reserva mental milhares de portugueses negros cujo único crime fora o de servirem o Exército Português Africano. O culto do banditismo político tem sido prática num país que se delícia em escrever a sua anti-história e juntar nomes de vítimas e assassinos, absolvendo as criaturas mais cavilosas a coberto de uma suposta inelutabilidade dos actos individuais, tomados como azares determinados pelas tais "leis históricas" e cobrir de ridículo aqueles que souberam manter a fidelidade a Portugal. Cabral experimentou, como tantos da sua geração - v. Pinto de Andrade - o maior e mais contraditório percurso político: quis ver a África independente, mas transformou-a em campo do experimentalismo do totalitarismo soviético nos trópicos; lutou contra os portugueses para, depois, pedir-lhes misericordioso acolhimento; abriu as portas da selvajaria e foi vítima dela. Luis de Almeida Cabral era a personificação desse desastre que foi a descolonização e o abandono da África.


Vi-o uma vez pelas ruas de Lisboa brincando aos senhores delicados. Quem diria que aquele contabilista Luís de Almeida Cabral, burguês e filho de literato, bolseiro da Casa dos Estudantes do Império, irmão de Amílcar - engenheiro do quadro do Ministério do Ultramar, Inspector-Geral do Comércio da colónia, investigador da Junta de Investigação do Ultramar e assistente universitário - fora durante meia dúzia de anos o mais implacável verdugo de tanto desgraçado atirado de mãos atadas para as valas comuns que deixou como espólio da sua presidência. Depois, quando a lei da cadeia alimentar o tocou de perto, fugiu para Cuba, onde não se conseguiu aclimatar, preferindo colocar-se sob protecção dos portugueses, que tanto detestara, deles recebendo casa e pensão vitalícia.

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